Da História e seus Simbolismos
Da História e seus Simbolismos: A Guerra Civil Americana, O Massacre de Charleston e Festa Confederada no Brasil
Jomo O. Campos, historiador e professor.
04/07/2015
Atualização: Janeiro de 2021
A Guerra Civil Americana
Entre 1861 e 1865 ocorreu a Guerra
Civil Americana - também conhecida como Guerra de Secessão. De um lado havia a
maior parte dos Estados da União, interessada em abolir a escravatura e dar
uniformidade a um projeto de desenvolvimento econômico, pautado na
industrialização. Do outro lado, formaram-se os Estados Confederados da América,
interessados em se separar do restante da federação e manter de uma sociedade que em muito se assemelhava ao
Brasil Colonial: monocultura, latifúndio e trabalho escravo.
Além dos aspectos econômicos, o que
esteve em jogo ao longo de toda essa Guerra Civil foi a idealização de um novo
modelo de civilização. O pensador Karl Marx chegou a afirmar que essa guerra seria como um
divisor de águas para a Esquerda; o proletariado branco deveria apoiar a luta
dos negros pela emancipação.
Imigração Estadunidense
Durante a Guerra e sobretudo após
o seu desfecho, milhares de confederados fogem dos EUA com destino à América do
Sul. Santa Bárbara D’Oeste e Americana são exemplos de cidades que se formaram
a partir dessa leva de imigrantes.
Simbologia
Ao contrário do que muitos pensam, a primeira bandeira oficial dos Confederados foi essa:
Essa, mais "popularizada" na atualidade, é a Bandeira de Batalha. As treze estrelas representam os Estados que faziam parte da Confederação.
Mas por que a bandeira de batalha é objeto de
debates acalorados e polêmicas até o presente dia? Como já mencionado
anteriormente o que estava em jogo na Guerra Civil eram projetos políticos ou
modos de vida que dariam molde a uma nação pelos próximos anos. Essa bandeira tornou-se muito mais utilizada nas décadas de 1940 a 1960 quando o governo
federal - em meio aos movimentos pela conquista de direitos civis da população
afro-americana - buscava formas de integrar todo país. A bandeira representaria o interesse de parte das comunidades sulistas em manter a segregação e
preservar seus privilégios dentro de uma hierarquia racial.
“No final dos anos ’40, a bandeira foi
adotada como um símbolo dos Dixiecrats – um partido político devotado, entre
outras coisas, a manter a segregação. Eles também se opuseram às propostas do
Presidente Harry S. Truman para estabelecer leis anti-discriminação e tornar
linchamento um crime federal.”
The Huffington Post
“[John M.] Coski escreve que embora os
Dixiecrats tenham rapidamente caído no obscurantismo, suas campanhas ‘tornaram
a bandeira um acessório em lugares onde ela teria sido apenas uma novidade
anteriormente. ’ Coski dá o exemplo da Universidade do Mississipi, onde ele
observa que raramente se usou a bandeira de batalha como um símbolo até 1948.”
The Huffington Post
Isso quer dizer que a bandeira, ao contrário do que afirmam
membros de certas comunidades, não diz respeito apenas a uma herança ou página
de sua história a ser lembrada. Há também um apelo separatista e racista.
“Ele diz que a universidade começou a incorporar
pesadamente o símbolo em atividades escolares e eventos alguns meses após os
estudantes terem protestado contra as propostas de direito civil do Truman.”
The Huffington Post
Em 1962 a universidade recebeu o primeiro estudante
afro-americano.
![]() |
James Howard Meredith |
Existem outros exemplos, como o da integração da bandeira
confederada à bandeira do Estado da Geórgia em 1956 – por motivações raciais e,
em de 1963 onde o governador do Alabama, George Wallace, ergueu a bandeira
sobre o Capitólio do Estado em protesto contra a desegregação.
Charleston, Junho de 2015
Charleston, uma cidade localizada no Estado da Carolina do
Sul, recentemente foi palco de um dos maiores atentados da História dos EUA. Dylann
Roof adentrou a Igreja Episcopal Metodista Africana de Emanuel e matou nove pessoas a tiro, incluindo o
reverendo e senador estadual Clementa C. Pinckney. A princípio os
investigadores tentavam definir se era um crime de “terrorismo doméstico” ou “crime
motivado por ódio”. O manifesto de Dylann, publicado parcial ou integralmente
em jornais, somado a fotos e outras evidências deixa explícita as motivações racistas do crime.
Inclusive, após o ato, recebeu a solidariedade de grupos que defendem a supremacia branca.
![]() |
Reverendo e Senador Clementa C. Pinckney |
![]() |
O racista assassino Dylann Roof |
![]() |
A ativista política afro-americana Bree Newsome retira a bandeira do mastro, em protesto |
Onde o Brasil
se encaixa nessa história?
Todos os anos, descendentes de confederados promovem a
Festa Confederada. Segundo Asher Levine, correspondente de notícias da agência
Reuters, a festa revive aspectos da cultura sulista dos EUA, expressos na música, dança
e culinária. A bandeira confederada hasteada no Brasil é vista pelos moradores das gerações atuais mais como “um símbolo étnico do que político”. Acrescenta que o ocorrido em
Charleston tem sido abordado no Brasil tanto mais como um problema de controle
de armas quanto uma questão racial. Todo o simbolismo da bandeira parece ter
sido perdido em terras brasileiras, ao longo de gerações.
![]() |
Festa Confederada em Americana |
O que não se pode perder de vista é que o Brasil já era um
país estruturalmente racista muito antes da chegada de confederados por aqui e
que o fato de eles terem se dirigido para cá em fins do século XIX não foi uma
coincidência, tal como não foi coincidência a criação da Klu Klux Klan e
Associação Nacional de Rifle (NRA) nos EUA. Foram organizações criadas para
defender um “jeito de ser” baseado na segregação, ódio e violência contra
minorias.
EUA, JANEIRO DE 2021
No dia 06 de Janeiro de 2021 o Capitólio foi invadido. Trump, em Dezembro de 2020, a partir de sua derrota nas urnas, havia prometido "um protesto selvagem" no começo do ano. A última vez que o Capitólio havia sido invadido foi em 1814, pela Grã-Bretanha, a partir da Camapnha de Chesapeake, numa tentativa de reconquistar sua colônia. A invasão resultou o incêndio do Capitólio e diversos edifícios governamentais e militares.
Referências
bibliográficas
JUNQUEIRA, Mary A. Estados Unidos – A Consolidação da
Nação. Coleção Repensando a História. São Paulo. Ed. Contexto, 2001.
KARNAL, Leandro. História dos Estados Unidos. São Paulo.
Editora Contexto, 2007.
EISENBERG, Peter Louis. Guerra Civil Americana. São Paulo.
Editora Brasiliense, 1982
Vídeos
BBC Brasil
TYT – The Young Turks – Racismo Perturbador por trás da
Bandeira dos Confederados
John Oliver, sobre o tiroteio em Charleston
CNN
E-Journal
The Daily
Beast
The Nation
VICE
VANITY FAIR
Comentários
Postar um comentário